1 INTRODUÇÃO
Na literatura entende-se que os antecedentes da lealdade do consumidor são: a confiança, confiabilidade, satisfação, comprometimento, percepção de valor, propensão a recompra (Jacoby e Kyner, 1973; Zaltman e Deshpandé, 1992; Moorman Deshpandé e Zaltman, 1993; Morgan e Hunt, 1994; Dick e Basu, 1994; Oliver, 1997; Oliver, 1999; Garbarino e Johnson, 1999; Levy e Weitz, 2000; Reiccheld e Schefter, 2000; Brei, 2001; Sirdeshmukh, Singh e Sabol, 2002; Larán e Espinoza, 2004; Agustin e Singh, 2005). No entanto, a lealdade do consumidor possui diversos níveis e classificações que são em parte convergentes, mas que não formam um conceito único. Na área de turismo estudos como a satisfação com a experiência de consumo (Jarvis, Stoeckl, Liu, 2016), indicadores da lealdade conativa (Choi, Lu e Cai, 2015) e satisfação do cliente para o ambiente de serviços de restaurantes (Angnes, Mello Moyano e Lengler, 2015) demonstram a importância do tema para a área.
Embora, os níveis ou a intensidade da lealdade sejam variáveis e seus antecedentes sejam formados por vários fatores entende-se que a dimensão atitudinal da lealdade, proposta por Oliver (1999) tem a capacidade de demonstrar a efetividade da lealdade, pois remete a atitude do consumidor, ou seja, o consumidor se põe em ação recomprando o produto. A lealdade nesta perspectiva é formada por questões hedônicas e utilitárias e se efetiva pela recompra da mesma marca, produto ou serviço, mesmo diante de estímulos para alternativas de mesma natureza ou de mesmo valor percebido (Oliver, 1999). A partir destas questões investigaram-se isoladamente os fatores causadores da recomendação e recompra, pois como admite Oliver (1999) os consumidores podem ser leais a mais de um produto simultaneamente. Foram medidos no estudo três construtos que têm capacidade explicativa para a Lealdade a partir da recomendação e recompra.
Utilizou-se para a coleta de dados deste trabalho um ambiente no qual se entendeu ter apelo emocional para o consumidor no qual avaliou-se os aspectos aspectos hedônicos e utilitários como antecedentes da recomendação e recompra (lealdade). O evento no qual foi realizada a coleta de dados é chamado “Natal Luz”, realizado anualmente na cidade de Gramado-RS, no qual um conjunto de espetáculos e atrações com temas natalinos atrai turistas brasileiros e estrangeiros no mês de dezembro de cada ano. Foram selecionados como amostra para este estudo frequentadores do evento, independente de quantas vezes o tivessem visitado, ou classe social, por exemplo, os indivíduos foram selecionados por conveniência dos pesquisadores.
Ao realizar a coleta de dados esperava-se que os aspectos hedônicos e utilitários explicassem os motivos pelos quais as pessoas recomendavam e recompravam o evento. Com essas predições elaborou-se três hipóteses que previam que: H1 os aspectos hedônicos influenciam a propensão à recomendação e recompra; H2: os aspectos utilitários influenciam na propensão à recomendação e recompra. H3: quanto maior a frequência de recompra do evento maior será a percepção utilitária.
Tomado este cenário o objetivo do presente trabalho foi demonstrar que os aspectos hedônicos e utilitários antecedem a recomendação e recompra (lealdade) e que a frequência de visitas a um evento modifica a percepção do consumidor sobre as motivações hedônicas e utilitárias, sendo que quanto maior a frequência de visitas ao evento mais utilitária é a motivação. Para tal intento procedeu-se uma survey medindo a percepção hedônica e utilitária em relação à recomendação e recompra moderada pela frequência de visitas ao evento. Os dados foram tratados com a utilização da técnica de modelagem de equações estruturais (MEE) e os resultados demonstraram que quanto mais os consumidores vão ao evento, maior é à força dos motivos utilitários para recomendação e recompra e que aspectos hedônicos e utilitários antecedem a recomendação e recompra.
2 FUNDAMENTAÇÃO DAS HIPÓTESES DO ESTUDO
Os programas de lealdade do consumidor são de grande importância para as empresas do setor varejista e a lealdade do consumidor é vista como um poder vital para a sobrevivência das empresas de varejo (Coll, 2013). Ressalta-se que é preciso observar a heterogenidade em estudos que envolvam a lealdade do consumidor a fim de capturar de forma mais precisa o construto (Chocarro, Cortinas, Villanueva, 2015). A forma como o consumidor se comporta em relação a lealdade também varia em acordo com sua cultura por isso estudos em diferentes países podem trazer constribuições interessantes para o entendimento do construto (Granot, Alejandro, Russell, 2014).
Para entender-se a Lealdade a partir da propensão à recomendação e recompra é necessário utilizar-se inicialmente de conceitos de lealdade do consumidor, pois a lealdade é a demonstração que um consumidor ou grupos de consumidores recompram um produto/marca/serviço podendo haver também a recomendação pra outros consumidores. Pesquisas indicam dois aspectos para a manutenção de relações duradouras que formam a base da lealdade do consumidor: a) confiança (Agustin e Singh, 2005; Sirdeshmukh, Singh e Sabol, 2002; Brei, 2001; Levy e Weitz, 2000; Reiccheld e Schefter, 2000; Garbarino e Johnson, 1999; Morgan e Hunt, 1994; Moorman Deshpandé e Zaltman, 1993; Zaltman e Deshpandé, 1992) b) satisfação e comprometimento (Garbarino e Johnson, 1999; Oliver, 1997).
A satisfação, a confiança e o comprometimento são os principais antecedentes da lealdade do consumidor sendo que estar satisfeito influencia positivamente a intenção de recomendação e recompra. Relações de confiança entre consumidor e o produto garantem ao consumidor a obtenção de trocas de alto valor em novas oportunidades com o mesmo fornecedor. No que tange ao comprometimento representa a motivação para uma das partes pelo menos repetir compras. Lealdade do consumidor é formada basicamente pela dimensão comportamental representada pelas compras repetidas, recomendação e indicação; e a dimensão de atitudes formada por elementos aspectos hedônicos e utilitários (Larán e Espinoza, 2004).
O significado do construto lealdade vai além da dimensão comportamental (recompra) sendo necessário levarem-se em conta os significados psicológicos. Dentro do construto lealdade para compreender-se a relação entre emoções e consumo Ledoux (2002) evidencia que afeto e cognição se desenvolvem em sistemas parcialmente independentes. As respostas afetivas sempre são precedidas de algum tipo de cognição, pois sem a cognição as emoções gerariam apenas um estado de ativação faltando os impulsos que direcionariam para a ação (Lazarus, 1991).
No marketing a lealdade pode estar relacionada a fatores como valor para o cliente, confiança e confiabilidade (Sirdeshmukh, Singh e Sabol, 2002) podendo ser entendida como padrões de compra repetidas, a partir de questões comportamentais do consumidor (Oliver, 1997). O constructo lealdade pode ser visto como um pilar dos relacionamentos a longo prazo entre marcas e consumidores formando relacionamentos comerciais duradouros. A lealdade também é efetada por aspectos mais tangíveis como as príprias características visuais ou das embalagens de produtos (Gómez, Martín-Consuegra e Molina, 2015).
Dick e Basu (1994) propuseram quatro dimensões que explicam a lealdade a partir da intensidade do comportamento de compra do consumidor, vistas a partir das atitudes e do comportamento: a) no momento que atitude e comportamento do consumidor são fracos não é possível observar a lealdade (Lealdade fraca). b) se existem taxas elevadas de recompra (consideradas como comportamento forte) e a atitude é fraca qualifica-se de Lealdade Espúria. c) Lealdade Latente ocorre devido a forte atitude (evidenciada pela preferência por um produto/marca/serviço), embora haja fraco comportamento de recompra do produto/marca/serviço; d) Lealdade ocorre quando se combina atitude forte e comportamento forte e percebe-se no consumidor o comprometimento com o produto/marca/serviço. Portanto a premissa da lealdade, na concepção de Dick e Basu (1994), ocorre quando existe intensa atitude positiva e elevada propensão a recompra.
Oliver (1999) entende que a lealdade pode ser melhor entendida a partir de uma hierarquia que se inicia pela Lealdade Cognitiva na qual um produto é escolhido ao invés de outro considerando especialmente os atributos e a performance do produto. O nível subsequente é chamado de lealdade Afetiva na qual devido a experiências satisfatórias já vivenciadas com o produto foram responsáveis por criar uma relação de afeto e apreço pelo produto. Esse nível é considerado menos suscetível a mudanças, pois se solidifica uma relação entre consumidor e objeto consumido pela afeição ou simplesmente o “gostar” de um produto. O terceiro nível é a Lealdade Conotativa, na qual o consumidor torna-se comprometido com o produto e o desejo de recompra é maior que nos outros níveis. O último nível da lealdade de Oliver (1999) é chamado Lealdade de Ação ocorre no momento em que e lealdade do consumidor converte-se em ação não apenas na recompra, mas também em desejo de superar obstáculos para efetivar a recompra.
O estado afetivo ligado ao consumo tem sido utilizado para nomear estados afetivos como sentimentos, humor e traços de personalidade. Os estados afetivos são diferenciados basicamente em intencionalidade (intencional ou não-intencional) relacionado ou não a um objeto ou a um estímulo, a duração (aguda, temperamental) e se existe tempo definido de duração. As emoções variam também em intensidade oscilando conforme a excitação antes da situação, o que é determinante, pois as decisões tomadas de bom-humor diferem-se de decisões tomadas de mau-humor (Desmet, 2003).
Holbrook e Hirschman (1982), Richins (1997) e Westbrook e Oliver (1991) destacam a influencia das emoções nas experiências de consumo que podem determinar as respostas dos consumidores aos estímulos de marketing. Estudos como os de Holbrook e Batra, (1987) tiveram como foco os impactos das emoções em relação à propaganda, nos processos de tomada de decisão destacam-se os trabalhos de Luce, Payne e Bettman, (1999) e na satisfação os trabalhos de Westbrook e Oliver, (1991).
Na relação entre emoções e consumo estão envolvidas interações sujeito/objeto identificadas como sentimentos, estado de satisfação ou e padrões de comportamento. Sentimentos são mais facilmente percebidos como emoções e são produtos da interação sujeito/objeto (Frijda, 2004). O afeto, que pode apresentar-se de forma positiva ou negativa, pode ser entendido a partir das alterações de si próprio e do mundo a seu redor (Moore e Fine, 1992). Estudos como os de Oliver, (1980) e Westbrook e Oliver, (1991) consideram as emoções posteriores ao consumo, mas dificilmente é possível negar o papel fundamental das emoções no consumo, que podem ser vistas como determinantes nas escolhas dos consumidores (Denzin, 1984; Holbrook, 1986).
Intenções de recomendação e recompra do consumidor dependem de atitudes e do nível de satisfação do consumidor com compras anteriores gerando as respostas que ocorrem por meio da desconfirmação de expectativas e qualidade percebida (Bitner, 1990; Bearden e Teel, 1983; Oliver, 1980; Boulding et al., 1993). Alguns dos aspectos determinantes para o relacionamento de longo prazo entre consumidor e marca, por exemplo, envolvem os custos de mudança de marca, aversão a risco, pressão social, desconhecimento de outras opções, inércia e as restrições impostas por contratos de fidelidade (Alba e Lutz, 2013).
As crenças e percepções individuais são determinantes na apreensão da realidade (Assael, 1992) e a aprendizagem cognitiva possui influência na lealdade do consumidor. Neste sentido as atitudes são geradas pela predisposição de um indivíduo a responder favoravelmente ou desfavoravelmente a objeto ou situação determinada (Fishbein e Ajzen, 1975). Nesse processo as crenças dos indivíduos relacionadas às consequências da compra são levadas em conta (Assael, 1992). Devido ao processamento de informação ser ligado à concepção de atitude o processo de lealdade é facilitado pelo aspecto cognitivo. A lealdade é formada então pela satisfação e o aprendizado comportamental e cognitivo sendo que a lealdade que tem como base a atitude que apresenta relação mais forte com a lealdade do que o comportamento (Ellis, 2000).
Embora se verifique que os padrões de compra repetida sejam de grande importância para explicar a lealdade, apenas a recompra é insuficiente para explicar o construto. Também é necessária a observância da compra repetida associada à resposta atitudinal caracterizada pelos aspectos hedônicos e utilitários. A lealdade pode ser entendida como uma resposta comportamental resultante da recompra ou do favorecimento de um produto, independente dos estímulos de marketing visando modificar a escolha (Jacoby e Chestnut, 1978; Dick e Basu, 1994; Oliver, 1999; Ellis, 2000). Por fim, Jacoby e Kyner (1973) entendem a lealdade verdadeira a uma produto ocorre pelas compras repetidas, ou seja, a forma mais clara e evidente de demonstrar a lealdade é pela sequência de recompras.
A Figura 1 resume os conceitos tratados nesta seção e foi elaborada para possibilitar ao leitor uma visão geral de como a teoria relaciona os construtos antecedentes e consequentes da lealdade. Dentre os principais antecedentes foram encontrados na revisão de literatura nessa seção: a confiança que o consumidor tem em relação ao vendedor ou a marca comprada, a confiabilidade que representa a reputação da empresa ou do produto, a satisfação com o objeto consumido, o comprometimento que o consumidor tem com a empresa ou com a marca ou produto, o valor percebido do produto comprado e a sua propensão a recomprar o produto. Quanto a lealdade em si existem duas correntes que classificam a lealdade a primeira a classifica em níveis e a segunda por sua intensidade. A lealdade apresenta-se em duas dimensões a comportamental que é demonstrada pela recomendação e recompra e a atitudinal que é constituída pelas dimansões hedônica e utilitária.
Fonte: elaborado pelos autores a partir de: Dick e Basu (1994); Sirdeshmukh, Singh e Sabol, (2002); Larán e Espinoza, (2004); Agustin e Singh, (2005); Brei, (2001); Levy e Weitz, (2000); Reiccheld e Schefter, (2000); Garbarino e Johnson, (1999); Morgan e Hunt, (1994); Moorman Deshpandé e Zaltman, (1993); Zaltman E Deshpandé, (1992); Oliver, (1997); Oliver (1999).
2.1 Aspectos hedônicos e utilitários
Os estudos sobre comportamento de consumo iniciaram-se avaliado as decisões dos consumidores como apenas racionais em uma perspectiva utilitária (Fisher e Arnold, 1990; Kang e Park-Poaps, 2009), no entanto o avanço das pesquisas sobre esse tema passou a considerar os valores hedônicos como importantes para explicar o consumo (Hirschman e Holdbrook, 1982; Halvena e Holdbrook, 1986; Hoffman e Novak, 1996).
Consumo hedônico foi definido por Hirschman e Holdbrook (1982) ao relacionar esse construto ao envolvimento multissensorial e emotivo o qual se relaciona às experiências dos consumidores e as expectativas dos produtos. Os avanços neste entendimento identificaram duas grandes categorias que explicam o consumo: valor utilitário e valor hedônico. O consumo utilitário tem um enfoque racional, motivado por necessidades racionalmente conhecidas e conceitualmente relacionado com parcimônia. O consumo hedônico se caracterizado pela busca dos desejos via um consumo experiencial que gera sentimentos atrelados à experiência de consumo que (Miller, 2000; Bardhi e Arnould, 2005).
As motivações de consumo estão associadas às atitudes em relação às marcas, podendo ser vistas como utilitárias e/ou hedônicas (Crowley; Spangenberg; Hughes, 1992; Spangenberg; Voss; Crowley, 1997; Voss; Spangenberg; Grohmann, 2003). Batra e Ahtola, (1990); Cardoso e Pinto, (2010) entendem que a associação do valor hedônico e utilitário pelo consumidor a um produto/marca/serviço está relacionada aos seguintes fatores: a) valor utilitário: baseada nos atributos funcionais (racionais) dos produtos/serviços; b) valor hedônico: baseada nas gratificações afetivas. Nessa perspectiva, qualquer atitude a um objeto (produto/serviço) é avaliada em termos de valores percebidos pelos consumidores como hedônicos e/ou utilitários (Gursoy; Spangenberg; Rutherford, 2006).
O valor hedônico é derivado de ideias como a exclusividade do bem, o significado simbólico, excitação emocional e evocação imaginária (Hirschman E Holdbrook, 1982; Spangenberg; Voss; Crowley, 1997). A dimensão hedônica é mais subjetiva e pessoal do que a dimensão utilitária (Babin; Darden; Griffin, 1994). O valor hedônico é derivado de uma necessidade de prazer e excitação, que pode ser proporcionada por determinados produtos/marcas/serviços (Dhar E Wertenbroch, 2000). Percorrer os caminhos do prazer são as motivações mais efetivas do consumo hedônico (Ramanathan E Menon, 2006).
No consumo hedonista entende-se que o prazer em realizar uma compra cria uma associação positiva a esta atividade (Forsythe; Butler; Kim, 1991). Scarpi (2006) identificou que consumidores mais consumistas possuem tendências mais hedonistas no consumo em relação aqueles com tendências mais utilitárias. Childers et al. (2001) ratificou os resultados de Scarpi (2006) no ambiente online. Babin, Darden e Griffin (1994) identificaram que os valores hedônicos de compra podem influenciar mais fortemente compras não planejadas, enquanto os valores utilitários não teriam a mesma efetividade.
2.2 Risco percebido e envolvimento do consumidor
Bettman (1973) propôs que cada classe de produto tem um risco associado a ela, sendo que tal risco passa a ficar saliente no momento em que o consumidor começa a interagir com a respectiva classe do bem. As percepções de risco (alta ou baixa) são reguladas por diferentes situações (Mcgregor, 2006). Basicamente, a percepção do risco está associada à incerteza e à consequência. Incerteza, relacionada à identificação do objetivo de compra ou ao processo de encontrar esses objetivos dentro da decisão de compra; e, consequência, vinculada aos aspectos funcionais, performance ou objetivos psicológicos, dinheiro, tempo e esforço investidos para atingir os objetivos (Huang; Schrank; Dubinsky, 2004).
Um novo produto ou uma nova situação de consumo aumenta o risco percebido, enquanto que a experiência reduz esta percepção (Branscomb; Auerswald, 2003; Hartmann; Myers, 2001). Um comprador, numa situação de risco, dá muito valor às informações disponíveis prestadas sobre o bem (Veres, 2009). Jacoby e Kaplan (1972) definiram cinco dimensões de risco percebido: risco psicológico, risco financeiro, risco de performance, risco físico e risco social.
Na perspectiva do envolvimento destaca-se a dicotomia entre envolvimento afetivo na qual as emoções são as principais responsáveis pela preferência do consumidor e o envolvimento cognitivo/racional no qual a relação custo-benefício emerge como determinante na preferência do consumidor (Vaughn, 1980).
O nível de envolvimento é determinado pela importância relativa das atitudes do indivíduo em relação a questões e objetos. Para o presente trabalho coube destacar o envolvimento situacional o qual é direcionado pelo nível de interesse, frequência de compra/recompra, complexidade dos atributos do produto e pelo preço. Este último item pode determinar o nível de envolvimento, ou seja, quanto maior o preço maior o risco percebido e maior o envolvimento. Bens duráveis absorvem mais envolvimento situacional do que bens não-duráveis (Arora, 1982; Rothschild, 1979; Houston e Rothschild, 1977).
Presença ou ausência de pessoas na situação de consumo e o ambiente social e psicológico, influenciam no processo de envolvimento sendo que no momento em que existem outras pessoas com expectativas normativas relevantes relacionadas ao consumo daquele produto o envolvimento torna-se maior fazendo a escolha mais complexa devido a percepção de maior risco com a decisão equivocada (Arora, 1982; Houston e Rothschild, 1977). Ao passo que a semelhança entre as opções de escolha tende a tornar a decisão mais fácil e de menor envolvimento, pois fica reduzido o risco de uma escolha ao invéz de outra, mesmo tendo a presença de outras pessoas (Houston e Rothschild, 1977).
Envolvimento duradouro ocorre quando sujeito e objeto estão intensamente relacionados e são derivados da experiência prévia do indivíduo e das necessidades da situação. Em casos de situações novas o envolvimento duradouro não é verificado devido a não haver ainda interação sujeito e objeto gerando a experiência. Nos casos em que houve consumo mais frequente de determinado produto o envolvimento é mais alto (Houston e Rothschild, 1977).
Na visão de Berkman, Lindquist e Sirgy (1996) e Wells e Prensky (1996) o envolvimento com o produto aumenta quando existe maior risco percebido na compra ou uso de produto/serviço que são influenciados por: a) alternativas disponíveis: quanto maior for à variedade de opções maior será o envolvimento situacional; b) diferenciação dos produtos: quanto mais heterogêneos forem os produtos, maior a percepção de risco e maior o envolvimento situacional; c) valor hedônico do produto: quanto maior o valor hedônico do produto maior o envolvimento.
2.2 Hipóteses
Tomando como base a revisão de literatura realizada entendeu-se que é possível que a Lealdade ocorra quando existe recomendação e recompra e que este efeito é formado por aspectos hedônicos (afetivo) e utilitários (cognitivo). No presente estudo também foi considerado o fator frequência de visitas ao evento como variável moderadora da recomendação e recompra. Conforme indicado pela revisão de literatura entendeu-se que a frequência de visitas ao evento reduziria o risco percebido e o envolvimento e por consequência quanto mais o consumidor visitar o evento menor será o risco percebido e o envolvimento com o produto que causam o aumento da percepção utilitária do evento. Com base nestas premissas desenvolveram-se três hipóteses e na Figura 2 apresentou-se o modelo hipotético.
H1 - os aspectos hedônicos influenciam a propensão à recomendação e recompra (lealdade).
H2 - os aspectos utilitários influenciam na propensão à recomendação e recompra (lealdade).
H3 - quanto maior a frequência de recompra do evento maior será a percepção utilitária.
3 METODOLOGIA DO ESTUDO
Foi realizado, para este trabalho, o método descritivo com a aplicação pessoal de questionários por julgar-se mais adequada para as características do tema investigado. Segundo Malhotra (2006), a pesquisa descritiva tem como objetivo descrever características do mercado por meio das opiniões ou atitudes dos pesquisados. A amostra de 412 questionários foi obtida por conveniência e classificada como não-probabilística devido a não ter sido realizados cálculos amostrais (Malhotra, 2006).
Com o objetivo de avaliar as dimensões que explicam a lealdade ao evento “Natal Luz” foi desenvolvido instrumento de coleta composto pelas dimensões “aspectos hedônicos”, “aspectos utilitários” e “lealdade” adaptado dos construtos do trabalho de Almeida e Nique (2007). Os questionários foram aplicados durante o evento Natal Luz em horários que não havia espetáculo nos locais de circulação de pessoas em diferentes momentos resultando em 412 com pessoas que frequentam o evento.
Foi calculado o Alfa de Cronbach para verificação da consistência interna das dimensões da referida escala. As dimensões “aspectos afetivos” (0,610); “aspectos cognitivos” (0,734) e “propensão e recomendação a recompra” (0,609) ficaram dentro dos padrões tolerados por Malhotra (2006). O levantamento de dados ocorreu durante a realização do evento “Natal Luz” no mês de dezembro 2011 e janeiro de 2012. O referido evento existe há mais de vinte e cinco anos e atrai anualmente milhares de turistas que movimentam a cidade de Gramado/RS, durante os meses de novembro a janeiro.
O procedimento de análise adotado nesta pesquisa foi o método de Modelagem de Equações Estruturais (MEE). Essa técnica examina uma série de relações através de um conjunto de métodos que identifica variáveis latentes, utilizando um conjunto de técnicas multivariadas, examinando múltiplas relações de dependências, simultaneamente entre essas variáveis (Schumacker E Lomax, 1996; Hair et al., 2005).
Para os ajustes finais do modelo e de suas hipoteses foi utilizado os seguintes índices: Qui-quadrado, graus de liberdade, nível de probabilidade, Comparative Fit Índex (CFI), Normed Fit índex (NFI), Goodness of Fit Index (GFI), Variância Extraída, confiabilidade, alpha de Crombach. Os critérios para avaliação da adequação do modelo foram encontrados em Mulaik, et al. 1989, Byrne (2009), Hair et al. (2005). A seguir são apresentados os resultados encontrados nesta pesquisa.
4 RESULTADOS
A amostra, composta por 412 questionários, foi não probabilística por conveniência, que segundo Malhotra (2006) ocorre através da obtenção de uma amostra com base na conveniência do formulador da pesquisa. Foram selecionados como amostra para este estudo frequentadores do evento, independente de quantas vezes o tivessem visitado, ou classe social, por exemplo; os indivíduos foram selecionados por conveniência dos pesquisadores. Segundo os dados socioeconômicos da amostra obteve-se respondentes com as seguintes características: 67% mulheres, 59,2% com idade entre 25 e 40 anos, 75,3% com ensino superior, 78,9% com renda entre R$ 1.000,00 e R$ 5.000,00, 70,3% estão em um relacionamento amoroso. Em relação a frequência de visitas ao evento obteve-se na coleta que 118 respondentes estavam visitando pela primeira vez (28,6%), 153 pela segunda vez (37,1%), 87 pela terceira vez (21,1%) e 54 pela quarta vez ou mais do que quatro vezes (13,1).
Antes de iniciar a validação individual dos construtos através da Análise Fatorial Confirmatória foi realizada uma análise dos pressupostos de normalidade nas variáveis observadas. Esta análise consistiu em um primeiro momento calcular e interpretar os indicadores de curtose, assimetria, médias amostrais e desvios de multinormalidade.
A curtose de cada variável observável foi avaliada através do Coeficiente de Mardia, sendo encontrados valores menores que cinco, sendo estes significativos, demonstrando presença de normalidade nas distribuições, de acordo com Mardia (1970) e Bentler (1995). Os valores associados à assimetria das variáveis observadas demonstraram coeficientes de assimetria de Pearson próximos de zero, caracterizando assim uma simetria moderada. Já as médias amostrais e os desvios de multinormalidade foram verificados através da distância de Mahalanobis. Neste teste, foram retirados trinta e oito questionários da amostra por terem uma distância grande entre o valor individual e as médias amostrais obtidas (Kline, 1998; Jöreskog, 1993). Depois dessa avaliação inicial da distribuição dos dados, optou-se pelo método de estimação de parâmetros da máxima verossimilhança (MLE), que é coerente com o padrão de normalidade das variáveis encontradas.
Tendo como foco, a Análise Fatorial Confirmatória, partiu-se então para a análise dos construtos do modelo originalmente proposto na teoria. Desta forma, desenvolveu-se a avaliação da confiabilidade composta dos construtos. Esta análise buscou avaliar a consistência com base nas cargas de mensuração reais. Os índices de confiabilidade composta de todos os construtos ficaram acima do desejável (0,70) (Hair, 2009), apresentando os seguintes resultados: “aspectos afetivos”: 0,82; “aspectos cognitivos”: 0,84; “propensão a recomendação de recompra”: 0,77.
Na sequência, refletiu-se sobre a validade discriminante e convergente dos respectivos construtos. Preliminarmente é interessante expor que as cargas fatoriais dos itens sobre cada variável latente evidenciaram loadings significativos a 0,01. Salientada esta informação, a tabela 1 apresenta a matriz de correlação onde é apresentada a variância extraída de cada construto (AVE) assim como a variância compartilhada (VC). Os resultados demonstram que as variáveis extraídas são sempre menores que as confiabilidades compostas dos construtos, confirmando desta forma a validade discriminante e convergente.
Constructos | Asp. Cognitivo | Asp. Afetivo | Prop. a recom. de recompra |
---|---|---|---|
Aspectos cognitivos | 0,99* | ||
Aspectos afetivos | 0,31** | 0,93* | |
Propensão a recomendação e recompra | 0,35** | 0,32** | 0,98* |
*Confiabilidade Composta
**Variância Extraída
4.2 Análise do Modelo Integrado
O modelo proposto no trabalho partiu da revisão bibliográfica sendo composta por três dimensões (aspectos afetivos; aspectos cognitivos e propensão à recomendação de recompra). Após realizar a Análise Fatorial Confirmatória para a construção e validação dos construtos, buscou-se avaliar o modelo integrado que agrega o modelo de mensuração e o modelo estrutural.
Com este procedimento, objetivou-se avaliar as relações entre os construtos (aspectos cognitivos; aspectos afetivos; propensão à recomendação e recompra) e as variáveis propostas no modelo. Seguindo a recomendação de diversos autores (Kline, 1998; Maruyama, 1998) a avaliação do modelo foi realizado a partir dos índices de ajuste do modelo e da significância estatística dos coeficientes de regressão estimados. Esta etapa serviu também, para testar as primeiras hipóteses do estudo.
Cabe ressaltar que a iniciativa de realizar as correlações sugeridas foi aceita, pois havia argumentação teórica que foi sustentada pela revisão teórica envolvendo lealdade e valor hedônico e utilitário. A correlação realizada foi a seguinte: construto “aspecto cognitivo” com o construto “aspecto afetivo”. A tabela 1 apresenta os coeficientes padronizados e significância do modelo integrado.
Observando os resultados apresentados na tabela 2, detecta-se uma relação negativa entre o construto “aspectos afetivos” e “propensão a reconhecimento de recompra”. O referido resultado tem força contrária ao esperado. Em relação à hipótese 2, onde era prevista uma relação positiva entre “aspectos cognitivos” e “propensão a reconhecimento e recompra” a mesma foi confirmada (1,172, p<0,001). A seguir foram exibidos os índices de ajustamento do modelo integrado, original e com ajustes.
Variável independente | Variável dependente | Coeficiente Padronizado | Desvio Padrão | Z | P | |
---|---|---|---|---|---|---|
Aspectos hedônicos/afetivos | ← | Propensão a Rec. de Recompra | - 0,191 | 0,078 | -2,660 | * |
Aspectos utilitários/cognitivos | ← | Propensão a Rec. de Recompra | 1,172 | 0,086 | 14,375 | *** |
(***) < 0,001;
(*) < 0,05
Índice | Análise Final | |
---|---|---|
Final | Inicial | |
Qui-quadrado | 684,290 | 1474,237 |
Graus de Liberdade | 132 | 132 |
Qui-quadrado/graus de liberdade | 5,18 | 11,08 |
CFI - Comparative Fit Index | 0,942 | 0,859 |
NFI – Normed Fit índex | 0,929 | 0,848 |
IFI | 0,942 | 0,860 |
TLI | 0,933 | 0,838 |
RMR | 0,022 | 0,230 |
RMSEA | 0,101 | 0,157 |
Diante dos resultados apresentados pelo modelo final ajustado, observa-se bons índices de ajustamento de CFI, NFI, IFI e TLI (Mulaik et al. 1989; Blunch, 2008), um nível próximo ao desejável para os índices de RMSEA e Qui-quadrado/graus de liberdade, além da adequação do RMR (Hair et al. 2005). A seguir foi apresentada a análise de moderação proposta.
4.3 Efeito moderador da frequência de consumo
No contexto desta pesquisa, a análise de moderação partiu da reflexão sobre os resultados apresentados na modelagem de equações estruturais a qual foi categorizada (em dois grupos) com a variável moderadora “frequência de consumo do espetáculo”, sendo que um grupo era formado por consumidores que já haviam assistido o espetáculo “Natal Luz” até duas vezes, e outro, que já presenciaram o referido evento mais de três vezes. A transformação dos grupos de frequência de consumo “mais alto” e “mais baixa” se deu por meio do software estatístico PASW 18. Na tabela 4 foi exibida a análise do efeito moderador entre os grupos analisados.
Trajetórias | Alta frequência de consumo | Baixa frequência de consumo | Diferença X2 |
---|---|---|---|
Aspectos Hedônicos ← Propensão a Rec. de Recompra | -0,334** | - 0,069 | 0,024 |
Aspectos Utilitários ← Propensão a Rec. de Recompra | 1,291** | 1,059** | 0,155 |
Observando os resultados apresentados na tabela 4, chega-se a conclusão de que existe o efeito moderador entre a frequência de consumo do espetáculo “Natal Luz” e a relação entre “aspectos hedônicos” e “propensão à recomendação de recompra”. Nota-se que para aqueles consumidores que foram mais de três vezes ao espetáculo, esta relação foi negativa e significativa, enquanto que a baixa na baixa frequência de consumo, a relação não existiu.
Partido para a reflexão da relação moderadora entre “frequência de consumo do espetáculo” e a relação entre os “aspectos utilitários” e “recomendação de recompra” observa-se que em ambos os grupos a relação foi significativa e positiva, tendo mais força para aqueles que foram com mais frequência ao evento. Por fim, apresentaram-se os índices de ajustamento de modelo utilizada na análise de moderação (Tabela 5) e com base na tabela de índice de ajuste do modelo (Tabela 5), observa-se adequação do modelo proposto (Arbuckle, 2008).
ÍNDICE | Default model | Aspectos Utilitários | Aspectos Hedônicos | CONTRAINED |
---|---|---|---|---|
Qui-quadrado (QQ) | 906,188 | 907,672 | 910,768 | 912,791 |
Graus de Liberdade (GL) | 264 | 264 | 265 | 266 |
Nível de Probabilidade | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 |
QQ / GL | 3,43 | 3,44 | 3,43 | 3,43 |
CFI - Comparative Fit Index | 0,935 | 0,935 | 0,935 | 0,935 |
NFI – Normed Fit Index | 0,911 | 0,911 | 0,911 | 0,911 |
IFI | 0,925 | 0,925 | 0,925 | 0,925 |
TLI | 0,935 | 0,935 | 0,935 | 0,935 |
RMR | 0,026 | 0,027 | 0,026 | 0,025 |
RMSEA - Root Mean Squared Error of Approximation | 0,77 | 0,77 | 0,77 | 0,77 |
Fonte: dados da pesquisa
Concluídos os procedimentos estatísticos necessários a validação do modelo e o teste do efeito moderador hipotetizado chegou-se ao resultado final do estudo no qual as três hipóteses foram confirmadas. A figura 3 resumiu os resultados e o modelo final do presente estudo no qual entendeu-se que quanto mais forte a percepção hedônica do evento menor a lealdade, quanto maior a percepção utilitária do evento maior a lealdade, quanto mais fraca a percepção hedônica do evento mais forte será a lealdade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente estudo procurou-se entender possíveis fatores moderadores que pudessem modificar as relações encontradas e evidenciou-se que a frequência de visita ao evento modifica o tipo de motivação para frequentar o evento. Os resultados demonstraram que quanto mais os consumidores vão ao evento, maior é à força dos motivos utilitários para recomendação e recompra do evento e que os aspectos hedônicos e utilitários explicam a recompra do evento.
O valor hedônico nos resultados encontrados diminui conforme o consumidor frequenta o evento. Esta evidencia possibilitou a inferência que após a primeira visita ao “Natal Luz” o consumidor desenvolve uma relação de utilidade com o espetáculo, podendo citar “razões” para sua escolha e quanto maior for a recompra maior será a racionalização da escolha pelas novas recompras do evento.
Entende-se que a replicação deste estudo em outro período não necessariamente influenciará os resultados devido ao tema estudado não depender apenas de questões temporais e sim das emoções despertadas durante o evento. Pode-se encontrar alguma variação devido à mudança de amostra ou mesmo de percepção de qualidade do evento, que pode gerar percepções diferentes. Sugere-se a replicação deste estudo para avaliar se edições diferentes geram percepções diferentes nas relações estudadas devido especialmente a variabilidade presente no setor de serviços que pode ocasionar mudança na qualidade percebida e outras variáveis. Um estudo longitudinal poderia trazer luz a questões como a variação de emoções e sentimentos em relação ao evento podendo demonstrar as possíveis variações nas percepções dos consumidores.
Além desses aspectos, sugere-se um estudo qualitativo de forma a entender melhor o perfil do público frequentador do evento e suas motivações para frequentá-lo e especialmente para retornar (lealdade). No presente estudo tais informações não estão disponíveis devido a natureza da coleta. Um estudo qualitativo possibilitaria trazer mais informações para complementar esses resultados entendendo inclusive possíveis motivos para as relações aqui evidenciadas terem demonstrado que aspectos utilitários proporcionam maior lealdade. Intuitivamente poderia pensar-se que os aspectos hedônicos seriam mais fortes e manteriam uma relação direta com a lealdade o que de fato não ocorreu.